Eu tenho a sensação de que não sei mais nada sobre khaliji; acho que deveria haver um movimento de revisão sobre o que é essa dança aqui no Brasil, por bailarinas que viveram nos Emirados Árabes, pois cada uma carrega sua verdade, que me parece estar errada. As bailarinas precisam abaixar a cabeça e admitir que NÃO sabem khaliji e estudar de novo, com quem realmente sabe e vivenciou a cultura khaliji. Por isso, pedi à Julia Falcão, que acabou de voltar de lá para o Brasil, para que escrevesse sobre o tema para o blog, pois não me sinto mais segura. Espero que gostem! [O texto e vídeos são de responsabilidade da autora, as fotos foram selecionados pelo blog]
OS FOLCLORES DO ORIENTE MÉDIO

Primeiramente deixem-me agradecer à queridissíma
Hanna Aisha por me confiar a tarefa de passar um pouquinho do meu conhecimento
a todas vocês: "Querida, um beijo enorme para ti, obrigada!". Praticamente tudo que irei dividir com vocês aqui é
baseado em experiências minhas, o que vi e vivi trabalhando pelo mundo com a
dança do ventre. Neste artigo, irei me ater somente aos dados técnicos de cada
folclore, uma vez que a parte histórica de construção de cada um está atrelado
aos costumes e cultura de cada país e o post ficaria ligeiramente longo com esta
enorme aula de história. Quem sabe esta pode ser uma boa sugestão para uma nova
visita minha no blog da Hanninha, não é verdade? [Nota da Hanna Aisha: sim!]. Entre cada folclore, eu procurei anexar vídeos
bastante fiéis ao estilo tradicional de cada dança e, em outros poucos,
acrescentei também como ele é usado mais frequentemente, ok?! Sem mais
delongas, seguimos a viagem por este mundo folclórico!
O Khalege (ou Khaleej ou ainda khaleeji) é uma dança
folclórica originária do Golfo Pérsico, o que já nos explica o nome, já que a
tradução de khalege é Golfo. Os países pertencentes ao Golfo Pérsico são:
Bahrain, Emirados Árabes, Qatar, Arábia Saudita, Kwait e Oman.
Durante anos, o khalege dançado aqui no Brasil sofreu
influência do khalege saudita (Arábia Saudita), que usa o ritmo saudi na
composição musical. Este khalege faz uso de uma movimentação dos pés
tradicional de khalege, um dos pés fica totalmente no chão enquanto o de trás
sofre uma elevação do calcanhar. Os pés se movimentam em uma troca constante de
peso (da perna direita para a esquerda, e assim por diante), porém deixando os
joelhos livres para trabalharem, o que causa uma pequena elevação em um dos
lados do quadril (lado da perna que está atrás). Observamos também que existem
diversas movimentações de braços e mãos bem característicos da dança. A cabeça e
os cabelos acompanham o ritmo saudi em movimentos circulares, oitos e alguns
movimentos pendulares também, mas ao compararmos com outros khaleges, concluímos
que estes movimentos de cabeça são em menor quantidade. É comum o uso de abayas
de mangas largas e bem coloridas:
Acredito que hoje em dia, as bailarinas brasileiras
têm se identificado mais com o khalege emirate, dançado nos Emirados Árabes,
também muito dançado em Bahrain e Oman. O khalege emirate sofre algumas
modificações em comparação ao saudita. As pernas parecem arrastar-se, mesmo que
mantenha o mesmo posicionamento das pernas e pés. Os joelhos amortecem a
elevação do calcanhar traseiro e acaba refletindo no quadril uma movimentação
quase horizontal e não vertical (subindo e descendo) como no saudita. Os
movimentos de mão e braços quase não aparecem mais e a movimentação de cabeça é
muito maior. Neste folclore, as
movimentações de quadril, shimmie, já começam a aparecer para marcar a música e
a posição dos pés muda com mais frequência.
Dentre todos os khaleges,
este é com certeza meu favorito. É mais leve, mais feminino, mais delicado, e
ao mesmo tempo intenso e, contraditoriamente, forte. Não há necessidade de se
usar abaya, mas hoje é bastante comum se ver bailarinas abusando de cores em
abayas super bordadas pelos palcos dos Emirados:
Alguém aí já ouviu falar em Radah? Conhecem sim. Este
folclore iraquiano foi carinhosamente apelidado de khalege iraquiano. Pois é,
este é o verdadeiro nome do "khalege iraquiano". Vamos aos
esclarecimentos então. Anteriormente, eu citei
alguns países do Golfo, certo? Repare que o Iraque não se encontra entre estes
países e como khalege quer dizer Golfo, o radah não pode ser realmente
considerado um khalege, não é verdade?
Bem, o Radah é beeeeeeeem
mais pesado e agressivo que os khaleges anteriores, as movimentações de cabeça
são exaustivas, mais fortes e mais variadas também. Pode absolutamente tudo com
a cabeça. A tradicional movimentação dos pés ainda existe, mas existe muitas
outras possibilidades para eles, os pés se abrem e se fecham em pulinhos, bem
como o corpo se vira lateralmente e voltando para a frente com o mesmo pulinho.
Os movimentos de braço e mão bonitinhos foram praticamente abolidos deste
folclore e o shimmie de quadril aparece muito mais.
O Radah também recebe uma
instrumentação diferenciada, o dundok, como é chamado pelos curdos. Existem
variações quanto ao nome deste instrumento conforme a região do Iraque, os
nomes mais conhecidos são Khishba, zamboor e tar. O dundok tem um som diferente
do tradicional derbak e aparece em toda e qualquer música para radah. Nos dias
de hoje, pode ser substituído por percussão eletrônica (para quem já jogou band
hero, a percussão eletrônica é bastante parecida com a bateria). A vestimenta tradicional
para este folclore iraquiano é um vestido mais ajustado na cintura e bem solto
nas pernas, na altura dos joelhos até os pés:
Sajedah Obied
O vídeo acima é bastante tradicional, dançado por
locais, por esse motivo escolhi este vídeo da Alena (Ucrânia), que fez uma
versão fantástica do Radah. Outra excelente referência é a Darya Mickevich:
O folclore Líbio é o mais simples e mais desconhecido
de todos, a movimentação é bastante simplificada e repetitiva. Usa-se um
movimento bastante semelhante ao "twist" (uma das pernas fica à frente do corpo, o
peso vai da perna da frente para a perna de trás enquanto o quadril torce da
frente para o eixo). Quase não há movimentação de cabeça e menos ainda movem-se
os braços. As músicas são bastante
alegres, embora repetitivas e sem marcações muito fortes. É considerado o ritmo
mais desconhecido em todo o mundo.
É um folclore muito comum
de ser visto na Tunísia, já que a Líbia é um país muito fechado. Os líbios se
deslocam em grande número para a Tunísia para curtirem o final de semana. Não
demorou muito para que os tunisianos percebessem que este turista deveria ser
agradado, já que formam grande número na clientela de restaurantes típicos
locais, com a inserção de seu folclore nos shows tunisianos.
Gurias, este foi apenas um pequeno guia para as
construções folclóricas de vocês, acredito que hoje já não se segue tudo à
risca. Acredito que a arte possa ser sempre modificada, aprimorada,
transformada para embelezar ainda mais os palcos do mundo, mas é sempre bom
sabermos a origem do que estamos dançando para que as modificações ainda possam
refletir equilíbrio, além de evitar algumas gafes, certo?
Espero que tenham curtido
esta pequena volta ao mundo comigo! Um beijo enorme para cada uma de vocês e
obrigada por me emprestarem seus olhos atentos, enquanto transmito um pouco do
meu conhecimento.
Júlia Falcão
julia_falcao@hotmail.com
A bailarina e professora Julia Falcão iniciou seus estudos em dança aos seis anos de idade com a modalidade de patinação artística e manteve-se nesta arte por 10 anos. Aos 16 anos, começou a praticar jazz com a professora Flávia Vargas por mais 4 anos. Nos anos seguintes, a dança do ventre começou a fazer parte de sua vida e hoje, 11 anos depois, se transformou na sua vida, além de carreira. Seu currículo envolve estudo com mestres e mestras brasileiras (Lulu Sabongi, Alessandra Forte, Camilla D'Amato, Kahina, entre outros), egípcios (Randa Kamel, Yousery Sharif, Gamal Seif, etc.), libaneses e israelenses (Orit Maftsir) e hoje já soma mais de 100 workshops em dança do ventre. No ano de 2009, entrou para Khan el Khalili como bailarina selecionada com padrão de qualidade e em 2010, foi eleita pelo Mercado Persa de São Paulo como a 2a melhor bailarina do Brasil. Recebeu diversos outros títulos pelo Brasil e foi campeã no solo profissional em diversos estados do Brasil e também como dupla profissional com sua irmã Marilia Falcão. Hoje, Julia está de volta ao Brasil após uma turnê de 2 anos e meio pelos países árabes, incluindo Emirados Árabes ( Dubai, Abu Dhabi e Al Ain), Tunisia, Bahrain, Jordânia e Iraque.
Preciso ler esse post! Ando sem tempo mas o início fala tudo, de fato há muitas verdades no quesito khalige e, logo, muitas brigas.
ResponderExcluirMuito honrada de ver uma foto minha no seu blog, ilustrando um de seus posts. Super beijo!!!
ResponderExcluirAcho que ainda tenho muito a aprender com essa dança...é muito mais interessante e rica do que eu pensava.
ResponderExcluirBeijos!